Consultório ou emergência pediátrica?

14/01/2025

Trabalhando em emergências pediátricas, é muito comum atendermos casos que poderiam ser vistos com calma em consultório médico. Qual o problema disso e por que isso acontece? Como fazer para evitar idas desnecessárias à emergência pediátrica?

Problemas:

- exposição da criança à doenças de ambiente hospitalar e outras crianças doentes

- sobrecarga dos serviços de urgência e emergência com casos leves

- procedimentos médicos desnecessários acabam sendo realizados

Por que isso acontece:

- ausência de acompanhamento e orientações adequadas por pediatra assistente

- dificuldade em se conseguir um horário em consultório pediátrico no momento da doença

- questões de logística, como não ter tempo ou possibilidade para buscar consulta em horário comercial por conta do trabalho dos responsáveis

- questões financeiras e de plano de saúde, por exemplo, o plano cobre a emergência mas não cobre o pediatra escolhido

- ansiedade dos cuidadores ou do próprio paciente

Como fazer para evitar idas desnecessárias à emergência pediátrica:

- assim que surgirem sinais e sintomas de doença, marcar consulta com pediatra assistente. Caso os sinais e sintomas desapareçam até a consulta, basta desmarcar. Caso permaneçam, terão a assistência necessária conforme o caso.

- nas consultas de rotina, pedir ao médico orientações de quais sinais ou sintomas são preocupantes e quando devemos levar a criança à emergência.

- também nas consultas de rotina, pedir ao médico que deixe prescrito as principais medidas de suporte para usar em doenças comuns, como gripes, resfriados e gastroenterites leves.

- manter em dia as consultas de rotina, as vacinas, boa alimentação, sono e atividades físicas, tanto da criança quanto da família!

- entender que a criança passará por doenças leves em seu processo de crescimento e amadurecimento do sistema de defesa. Muitas vezes não há nada que um atendimento emergencial possa curar imediatamente nesses casos leves. O suporte com medicamentos sintomáticos, repouso, hidratação, alimentação e a confiança nos mecanismos de defesa da criança são suficientes e protetores contra exageros de intervenção.

A emergência sempre será uma opção, mesmo para casos leves. Porém vale a gente ter consciência dessas questões e deixar a emergência para plano de contingência, e não como primeira opção para doenças leves. Caso seja inevitável, vá com máscara cirúrgica, use álcool gel, mantenha distância dos outros pacientes e controle o contato com superfícies possivelmente contaminadas. 

Aqui deixo uma lista de sinais de sintomas que podem requerer ida na emergência pediátrica:

1) Sinais de esforço respiratório – respiração acelerada, narinas abrindo e fechando durante a respiração, covinha abaixo do gogó afundando muito, costelas muito marcadas durante a inspiração, barriga subindo e descendo de forma a marcar bastante o rebordo costal, lábios pálidos ou azulados, cabeça balançando demais de acordo com a respiração, tão cansado que não consegue emitir sons ou emite som de assovio.

2) Vômitos incoercíveis - são aqueles vômitos que vem um atrás do outro, com poucos minutos de intervalo, em grande quantidade - grande chance de desidratar, melhor fazer medicação injetável para parar.

3) Vômito em jato acompanhado de alterações de comportamento (prostração exagerada ou irritabilidade exagerada) e/ou dor de cabeça - são vômitos não explicados por gastroenterite, ou seja, não são precedidos de outros sintomas, como enjoo e dor abdominal ou sintomas respiratórios. Eles acontecem do nada, em grande quantidade, e podem significar alteração neurológica.

4) Diarreia em grande quantidade e muitas vezes dentro de poucas horas - grande chance de desidratar, também é bom que seja avaliado logo.

5) Manchas vermelhas elevadas difusas e que coçam pelo corpo (urticária), especialmente se houver inchaço na face, tosse e dor abdominal.

6) Manchas arroxeadas difusas na pele.

7) Sangramentos importantes – volumosos e/ou que não cessam.

8) Dores intensas que não melhoram com analgésicos comuns.

9) Convulsões.

10) Perda de consciência (desmaio, síncope).

11) Sinais de desidratação: olho fundo + boca seca + choro sem lágrimas + prostração ou irritabilidade + coração acelerado com a criança quietinha + pouco ou nenhum xixi + pele endurecida + moleira funda.

12) Recusa total de líquidos – por exemplo, criança com gastroenterite ou gripe que está há muitas horas sem aceitar nada por via oral (nem seio materno, nem mamadeira, nem água, nada).

13) Alteração inexplicada de comportamento - aquela criança que do nada ficou muito prostrada, sonolenta o dia inteiro, deixou de brincar. Ou que está irritada demais, nada consola durante horas.

14) Traumas importantes, como quedas acima de 1 metro de altura com impacto na cabeça, fraturas, contraturas importantes.

15) Ingestão acidental de medicamentos ou produtos químicos.

16) Picadas de animais peçonhentos.

SOBRE FEBRE

Temperatura axilar maior ou igual a 37,8°C.

Febre, por si só, não é uma indicação para ir à emergência. Marcar consulta em consultório comum.

Mas, em algumas ocasiões, pode ser necessário:

• Febres em recém-nascidos (até 28 dias de vida) – a criança deve ser avaliada o quanto antes.

• Febre alta (acima de 39,5°C) em crianças abaixo de 2 anos e que não está baixando depois do antitérmico em casa – a ida na emergência pode ser uma opção para medicação venosa ou intramuscular.

• Febres persistentes (a cada 4 horas mais ou menos) em menores de 6 meses, se não der para ser visto logo em consultório, melhor levar na emergência.

Obs.: Febre costuma vir acompanhada de prostração, coração acelerado e respiração discretamente acelerada, sem que isso seja sinal de alarme. Nesses casos, pode administrar o antitérmico e observar como a criança fica após 1-2h da dose. Se persistir com esses sinais em temperatura corporal normal (abaixo de 37,8°C), vale avaliação médica de urgência.